O Estado, enquanto primeiro responsável por criar os mecanismos de garantia da qualidade da formação de ensino superior oferecida, e as instituições de ensino superior, que concretizam essa formação, devem promover processos de avaliação suficientemente robustos que permitam aferir a qualidade da formação ministrada.
A implementação de uma cultura de avaliação regular para a melhoria contínua das instituições de ensino superior e da formação que oferecem é um processo moroso, que tem encontrado diferentes resistências, num sistema e num País desconfiado dos processos de avaliação. Ainda assim, com particular incidência na última década, foram criados novos mecanismos de avaliação da oferta formativa e das próprias instituições, com o objetivo de estabelecer um sistema de garantia da qualidade do ensino superior, reconhecido internacionalmente, e cuja avaliação terminou em junho de 2014 com a publicação do relatório final da avaliação da A3ES pela ENQA.
Um dos princípios subjacentes à criação de um sistema de garantia da qualidade é a necessidade de conceber um sistema que, com base nos resultados da autoavaliação das instituições de ensino superior, seja realizado efetivamente por entidades externas e não por entidades delas representativas em cuja atividade se confundiam avaliadores externos e avaliados. Concretizou-se então a criação de uma agência de garantia da qualidade do ensino superior, a A3ES, independente das instituições a avaliar, ao contrário da prática até então seguida, com o mandato de desenvolver os procedimentos de avaliação previstos no Regime Jurídico da Avaliação do Ensino Superior (Lei n.º 37/2008, de 16 de agosto).
No início do processo de avaliação e acreditação, considerando o elevado número de cursos registados na DGES (5262 cursos registados) foi introduzida uma forma preliminar de avaliação, baseada em padrões mínimos de qualidade. Desses 5262 cursos registados, as instituições submeteram a acreditação preliminar 4379 (menos 883), dos quais 756, aparentemente, não satisfaziam os padrões legais mínimos para acreditação - 335 foram descontinuados por decisão voluntária das instituições e 421 submetidos a um processo de avaliação e acreditação.
O processo de avaliação e acreditação é um processo dinâmico, estando a decorrer simultaneamente processos de avaliação dos ciclos de estudos acreditados preliminarmente e de novos ciclos de estudos submetidos a acreditação prévia; as instituições têm vindo a ajustar a sua oferta formativa de forma a cumprir os padrões mínimos de qualidade e para aumentar a eficiência da instituição, o que tem levado quer ao encerramento de cursos que não obtiveram acreditação preliminar, quer à criação de novos ciclos de estudos.
Até ao final de 2016 terá sido concluído o ciclo regular de avaliação e acreditação dos ciclos de estudos, o que permitirá reconstituir as bases de dados inicialmente construídas com base nas informações enviadas pelas instituições. O processo de avaliação da oferta formativa tem sido moroso, mas, se realizado de forma séria e independente como tem acontecido, permitirá inequivocamente incentivar a melhoria da qualidade das formações oferecidas
Como já referido anteriormente, o não cumprimento de padrões mínimos de qualidade num ciclo estudos resulta na não acreditação do mesmo, o que significa que tal curso deixa de poder ser oferecido pela instituição e receber novos estudantes. Concordando com tal consequência, a FAP discorda do procedimento previsto para os estudantes que frequentavam o ciclo de estudos à data do seu funcionamento: «o mesmo ciclo de estudos pode, no entanto, continuar a funcionar regularmente, por mais dois anos letivos, com os alunos nele matriculados e inscritos, de modo a possibilitar-lhes a sua conclusão» (n.º 3 da Resolução n.º 53/2012 da A3ES) e «o período referido no n.º 3 pode ser prorrogado, nos casos em que especiais circunstâncias de funcionamento do ciclo de estudos ou da situação dos alunos nele inscritos o justifiquem» (n.º 5 da Resolução n.º 53/2012 da A3ES). Por entender que a necessidade de encerramento de um ciclo de estudos por não se verificarem os padrões mínimos de qualidade é a situação limite a que tal formação chegou pela ineficácia da ação do Estado na sua missão de regulação da oferta formativa, a FAP defende que o procedimento estabelecido deve salvaguardar os interesses dos estudantes, que podem pretender mudar para um curso congénere numa outra instituição de ensino. Essa vontade deve ser apoiada pelo Estado, garantindo que o estudante nunca é prejudicado financeiramente por tal mudança, devendo ser criados os regimes excecionais necessários e dotadas as instituições dos meios que as salvaguardem porque se trata também de uma situação extraordinária da qual o estudante não apresenta culpa alguma.
Desde 2010, está em curso um exercício experimental de envolvimento de estudantes nas Comissões de Avaliação Externa, do qual devem ser retiradas ilações que permitam corrigir eventuais fragilidades. Havendo dados suficientes para dar o passo seguinte e dando seguimento às melhores práticas e recomendações internacionais, vincadas também pela ENQA na recente avaliação à A3ES, deve ser dado um maior protagonismo e potenciada uma maior participação dos estudantes nos processos avaliativos promovidos pela Agência. Assim, defende a FAP que esse primeiro passo pode muito bem ser a exigência de que as CAE incluam um membro estudante de pleno direito. Esta mudança representa um importante contributo dos estudantes na avaliação externa.
O sistema de garantia da qualidade do ensino superior pretende igualmente desenvolver sistemas internos de garantia de qualidade em cada instituição de ensino superior, que periodicamente seriam verificados por procedimentos de auditoria externa. Aliás, o período regular de acreditação de todos os ciclos de estudos pressupunha a existência de processos voluntários de auditoria dos sistemas internos de garantia da qualidade das instituições, promovendo-se também a implementação e certificação desses mesmos sistemas tendo em vista a fase posterior do sistema de qualidade, baseado essencialmente no reconhecimento de que os principais agentes responsáveis pela qualidade do ensino são as próprias instituições. Antevia-se assim o caminho de futuro de todo o processo, após uma primeira fase de 6 anos a acreditar e avaliar os cursos, um a um, através das CAE.
Assim, compreendendo a necessidade de simplificação dos processos de avaliação e acreditação, por não ser exequível, administrativa e financeiramente, uma avaliação regular curso a curso, é importante salvaguardar que não se volte a internalizar a avaliação da qualidade das instituições e da sua oferta formativa, quando na base do sistema atual esteve precisamente o contrário: garantir que a avaliação é realizada por entidades verdadeiramente externas e independentes.
Os inquéritos pedagógicos distribuídos nas instituições de ensino superior deveriam ser uma ferramenta essencial na garantia da qualidade de ensino; contudo, atualmente, vivem num ciclo vicioso que os conduz à inutilidade: a ausência de divulgação e consequência dos resultados desincentiva a participação dos estudantes, o que prejudica a fiabilidade dos resultados, que, por essa razão, não podem ser publicitados e associados a determinadas consequências. É importante rever de forma séria a adequação dos inquéritos pedagógicos às instituições de ensino superior e aos cursos a que se destinam, pois fará sentido a existência de alguma comparabilidade dentro da mesma instituição, mas certamente deixará de fazer sentido que o inquérito seja igual para um estudante de Medicina ou para um estudante de Direito. Será necessário encontrar um ponto de equilíbrio que permita perceber até onde é que os inquéritos devem ser iguais, reservando uma parcela do mesmo a perguntas específicas sobre a unidade curricular ou o docente em avaliação.
Também alerta a FAP que deve existir reflexão sobre a época do ano em que os inquéritos são realizados. É importante perceber que unidades curriculares modulares não devem ser avaliadas apenas no final do semestre ou do ano letivo, sob pena do desfasamento provocar grande desinteresse aos estudantes ou a fraca qualidade dos resultados. Assim, defende a FAP que deve existir não só uma adequação temática aos inquéritos realizados, mas também uma adequação temporal na sua aplicação.
Ainda neste seguimento, a FAP propõe que os inquéritos passem a ser de resposta obrigatória, tendo como contrapartida o seu tratamento e divulgação de resultados semestralmente. Para salvaguardar e evitar distorções dos resultados provocadas pelas respostas não ponderadas daqueles que não tenham intenção de participar no processo, deve existir sempre a opção «não sabe; não responde» ou equivalente. A acrescer a isto, todos os inquéritos devem ter um campo de escrita livre para que possam ser acrescentadas informações úteis por parte dos estudantes. Acredita a FAP que estas alterações produziriam resultados mais profícuos na hora de aplicar os resultados dos inquéritos pedagógicos, contribuindo para que se efetivem como ferramenta poderosa na avaliação interna das instituições.
A FAP apresenta-se contra a implementação de rankings por assentarem numa seriação comparativa redutora a uma posição numa determinada série de instituições. No entanto, a FAP defende que podem existir vantagens na implementação nacional de um sistema de ratings, com 4 níveis positivos de qualidade, cuja classificação seria atribuída à instituição como resultado da sua avaliação global pela A3ES, bem como aos cursos individualmente considerados, podendo também corresponder isso a uma avaliação da unidade orgânica, sempre que tal possa ser considerado. Esta aferição e publicitação da qualidade relativa dos cursos, das unidades orgânicas e das instituições revelaria maior transparência no momento de avaliação, bem como poderia ser fator decisivo para permitir às instituições determinadas missões. No nosso entender, tal sistema de ratings, uma vez implementado, e devidamente articulado com a avaliação da investigação, hoje já feita pela FCT, deve ser a base do sistema de qualidade na qual deve assentar a possibilidade das IES ministrarem cursos de 3.° ciclo. Não faz sentido, no atual momento, que a diferença administrativa de subsistema seja causa única para permitir ou não a existência de doutoramentos em determinadas instituições, sendo o método proposto muito mais transparente e justo na aferição de qualidade das instituições e das suas unidades orgânicas.
Encerramento de ciclos de estudos
Envolvimento dos estudantes na avaliação externa
O futuro da avaliação
Inquéritos pedagógicos
Rankings e ratings